quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Vergonha

O amor a verdade nos deixa expostos.

A vergonha é um dos aspectos do ego, não é real. É um estado de ser que nasce de uma psique frágil, insegura, cheia de ilusões sobre si mesma.

A vergonha nos causa sentimentos de opressão, tristeza, infelicidade, dor e sofrimento. Esta dor é uma dor psicológica, trazida pelas sensações de perda, exposição, erro, inferioridade, humilhação, pela inibição, constrangimento, timidez.

A vergonha é paralisante, pode nos impedir de participarmos de muitas situações na vida. Inesperada e desconcertante, a vergonha nos aprisiona dentro de nós mesmos.

Por vergonha, mentimos, fingimos, dissimulamos, falseamos, inventamos, criamos desculpas, explicações, justificativas, não somos fortes, não temos a coragem e a ousadia de aceitarmos nossos erros, nossos limites, nossas imperfeições. Estamos sempre atrás da aceitação dos outros.

Sentimos vergonha quando nosso lado sombra é exposto, quando nossas máscaras caem, quando achamos que vamos perder o controle, quando a sensação de exposição, inferioridade, humilhação, fracasso, imperfeição, inadequação e fraqueza nos domina, quando ficamos expostos em toda a nossa falsidade, maldade, maledicência, arrogância.

Podemos sentir vergonha por um evento passado, presente ou futuro. Este último caso é, na realidade, um medo de sentir vergonha.

A vergonha é a sensação de que nos depreciamos dentro do conceito de outrem. A vergonha é o resultado de uma preocupação exagerada com a nossa reputação, com a nossa auto-imagem. Aquele que sente vergonha está envergonhado do que é, ou seja, não se aceita como é.

A vergonha é o medo da zombaria, da ridicularização, da exposição, da humilhação, da desonra, do embaraço, da retaliação moral ou material, do castigo, da punição, da rejeição. É a preocupação com o que os outros vão achar, com o que os outros vão dizer, com o que os outros vão pensar, com o que os outros vão fazer. O foco essencial do sentimento de vergonha está no lugar do juízo alheio.

Em verdade, a vergonha é a preocupação com a maldade, o preconceito, a vaidade, a arrogância, dos outros, que não passam de projeções de nossos próprios demônios. Quando projetamos nossas idéias, por mais inconscientes que sejam, ficamos com vergonha por nos sentirmos expostos. Devemos compreender e enfrentar as situações e os nossos demônios. Só assim poderemos vencer as nossas vergonhas.

Sentimos vergonha porque nos cobramos demais, porque vivemos em conflito com nós mesmos, porque nos identificamos, porque nos projetamos, porque não nos aceitamos, porque somos vaidosos, orgulhosos, porque não nos permitirmos errar.

Normalmente as coisas que podem nos acontecer não têm importância real, mas se estamos atribuindo a estas coisas uma importância maior que o seu próprio tamanho, então temos aí uma projeção de nossa auto-importância, temos aí um ótimo material para análise.

A importância que tem para nós o escárnio e a zombaria do tolo não é senão a importância que damos ao orgulho, à vaidade que temos de nossa fantasiosa auto-imagem.

Não existe importância real em qualquer rótulo que possamos receber por nossas falhas, nossos atos fora de padrão. A grande preocupação está em receber os rótulos que julgamos negativos, maus, inferiores. Isto ocorre porque estamos identificados com rótulos que pré-definimos como positivos, bons, superiores.

O escárnio, o deboche e o sarcasmo virão, é certo. Se nos ressentiremos ou não, se reagiremos ou não, dependerá da nossa capacidade de compreensão, da não identificação, da compaixão, da tolerância, da paciência, da aceitação, da humildade.

Sentimos vergonha quando colocamos nossos egos acima dos fatos, quando acreditamos que eles são mais importantes do que os fatos ao seu redor. Quando, por exemplo, achamos que é mais importante manter a imagem do funcionário ideal do que executar o trabalho em si, da melhor forma possível, sentimos vergonha diante dos erros, que inevitavelmente acontecem.

O elogio, a auto-imagem, o status, a sensação de poder, de prazer, tornaram-se mais importantes do que o trabalho. Então, quando acontece a possibilidade de crítica, quando acontece uma exposição, uma ameaça à auto-imagem, sentimos vergonha. Se o foco for o trabalho e não o ego, é possível ver cada erro como uma forma de aprendizado.

Não resistir aos erros, não tentar evitá-los, aceitá-los com naturalidade, faz parte de nosso crescimento. Se o foco for o trabalho e não o ego, o que existe é apenas o trabalhar, o ego se desfaz no trabalhar, o “eu trabalhando” não está em evidência, e isso nos leva à paz, à tranqüilidade, à serenidade. Melhor ainda pode ser quando dedicamos, quando devotamos esse trabalho ao nosso Deus Interno, ao nosso Pai Interno, à nossa Mãe Divina. Se o desfazer-se nos leva à paz, o devotar-se nos leva ao êxtase.

Quando nos tornamos, ou melhor, quando nos colocamos como objeto da atenção alheia, sentimos como se houvéssemos perdido o controle da situação, como se estivéssemos em poder de terceiros, ficamos com uma terrível sensação de impotência. É comum enrubescermos quando nos tornamos objeto da atenção de um grupo de pessoas, seja ele grande ou pequeno, mesmo que esta atenção seja motivada pelo elogio. Neste caso, somos propensos a sentir orgulho e vergonha ao mesmo tempo.

Muitas vezes, aquele que enrubesce fica ainda mais vermelho pela vergonha de ter enrubescido, pois sente-se mais exposto por tal reação. É difícil aceitarmos nossas condições, nossos limites, queremos ser perfeitos, queremos parecer perfeitos.

Quando ficamos ansiosos, quando ficamos na expectativa de nos sairmos bem em uma determinada situação, quando chegamos a esse ponto, já estamos identificados com a personalidade, é o ego que quer se sair bem. A ansiedade gera tensão e nervosismo, que arduamente tentamos disfarçar para que os outros não percebam.


Não aceitamos o estado em que nos encontramos, começamos a ficar com vergonha do nosso próprio estado emocional, e um imenso conflito, uma enorme pressão ocorre dentro de nós.

Por vergonha de pedir orientação no trânsito, por exemplo, podemos desperdiçar um enorme tempo circulando perdidos pelas ruas. Podemos chegar até a perdermos um compromisso importante por causa disso.

Quanto maior a vaidade, o orgulho, o amor próprio, o apego à auto-imagem, maior o medo da vergonha, maior o medo de ser rotulado, julgado, rejeitado, maior a nossa resistência.

Quando somos observados, quando percebemos que alguém nos observa, ou mesmo quando imaginamos que alguém está nos observando, alteramos nossas feições, nosso modo de andar, nossa postura.

O observador pode até nem dizer nada, nem pensar nada, mas nos colocamos como objeto do pensamento, do olhar dele, e, identificados com nossas fantasias, com nossa auto-imagem, toda uma revolução se deflagra dentro de nós. Se um sujeito é vaidoso, por exemplo, irá se sentir o máximo ao acreditar que está sendo admirado.

Sentimos vergonha em situações de humilhação, mas também podemos sentir vergonha em situações de elogios. Sentimos vergonha por desejarmos parecer aquilo que não somos.

Parece que a vergonha está sempre associada a sensações de exposição, vulnerabilidade, inferioridade. Estas sensações não ocorrem com todo mundo, não ocorrem com qualquer um. Ocorrem se existir a possibilidade de os outros perceberem nossos erros, nossas falhas, nossos limites, nossas dificuldades, pois sempre nos achamos melhores, nos achamos superiores diante de quem erra.

Assim, se erramos, nos sentimos inferiorizados. E aí certamente sentiremos vergonha daquelas pessoas que acreditamos estar em nível igual ou, sobretudo, acima do nosso. É uma questão de autodefinição e definição dos outros, comparação entre definições, relação entre definições.

Se o simples fato de sermos julgados causasse, por si só, vergonha, viveríamos eternamente envergonhados. Afinal, sempre existe alguém a nos julgar, assim como sempre costumamos julgar os outros.

Não existe alguém que tenha a aprovação de todos, que tenha aceitação de todos. Assim, podemos observar facilmente que não sentimos vergonha perante qualquer juízo, perante o juízo de qualquer um. O juízo que pressupõe alguém reconhecidamente capaz de julgar é o juízo que nos faz sentir vergonha.

Sentimos vergonha quando, ao dizermos ou fazermos algo, nos lançam olhares de desprezo, espanto, assombro, como se estivessem a nos chamar de burros, de idiotas. Parece que ainda temos medo de cara feia. Se ficamos preocupados com a opinião dos outros é porque damos muita importância para a nossa própria opinião. Se ficamos preocupados com o julgamento dos outros é porque ainda julgamos muito.

Quando somos traídos, também sentimos vergonha. Ficamos com a auto-imagem e o orgulho feridos, porque acreditamos que vão sentir dó de nós, rir de nós, porque vão achar que somos tolos, fracos, incapazes.

Devemos compreender bem a vergonha, a culpa e o medo, pois esses sentimentos escondem muitos dos nossos condicionamentos.

Estamos sempre preocupados em não passar vergonha, em sofrer perdas, retaliações, rejeições, desmoralizações. Todas essas circunstâncias estão condicionadas ao ego, não ao Ser. Porém, atribuímos mais importância ao nosso ego do que ao nosso Ser, à nossa consciência ou o Self, como diz Jung.

A vergonha é gerada a partir da crença nas ameaças, ameaças contra a auto-imagem e contra as ilusões que alimentamos sobre nós mesmos; ameaças de perdermos nossas virtudes, ilusórias virtudes, pois as virtudes reais, conscientes, nunca perdemos.

O arrependimento é a tomada de consciência, não é um motivo de vergonha, mas de alegria, pois significa uma expansão da consciência. Sem consciência, somo vítimas de nossos egos, o que sentimos em situações aparentemente constrangedoras é medo, vergonha, orgulho, vaidade.

Ao reduzirmos o medo, a culpa, a ansiedade e a vergonha, precisamos cuidar para que não passemos a agir com descaso, desrespeito, indiferença, desprezo, desatenção, desdém, desleixo, desmazelo. É necessário que eliminemos nossos defeitos e cultivemos virtudes em seus lugares, virtudes conscientes.



Palavras de: Fabio F Bolota
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