A arte de viajar pressupõe a importante noção de não complicar. Pode até ser impossível não haver uma chateação na hora de organizar uma viagem de férias ou de trabalho ou de estudos, mas a postura do viajante deve ser de total tranquilidade diante das adversidades, por maiores que sejam. É comum o desespero quando estamos numa cidade desconhecida, com apenas um guia em mãos para se virar como puder, mas cabem as questões: como e para quê estou aqui? O que devo aprender com essa dificuldade, justamente agora? É essencial aproveitar a estadia naquele local para realizar as tarefas (caso elas estejam no seu itinerário) ou aproveitar as paisagens, os pratos e as pessoas que encontramos pelo caminho.
A experiência espiritual na atitude de viajar pode estar na admiração e no amor pelo lugar onde se está. Não estamos à toa naquele lugar, nem mesmo quando nos desviamos da rota e do destino antes programado. Tudo que acontece tem algum sentido, seja o trem que se perde ou a grande fila para visitar um ponto turístico. A viagem é uma forma de autoconhecimento, é participar da intensidade de seguir o curso das coisas, dos fatos e dos horários de que nos apropriamos. "A viagem é uma forma de autoconhecimento, é participar da intensidade de seguir o curso das coisas, dos fatos e dos horários de que nos apropriamos". Saber que existem imprevistos, como em todas as etapas da vida e nem por isso perder o ânimo. Tomar consciência de que existe uma razão de se estar ali, mesmo que num primeiro momento ela seja enigmática: por que, especificamente, aquela cidade, aquele país, aquele continente? Essas perguntas podem ser respondidas, num primeiro momento, como uma necessidade de sair do lugar-comum e aceitar os ditames que o mundo exige de nós. Para isso, basta confiarmos nele, em suas rotas e suas paradas.
Além do turismo
Muito mais que turismo, viajar pode ser um exercício espiritual, uma verdadeira peregrinação: sentir cada paisagem e cada parte dos trajetos como uma extensão de nós mesmos."Muito mais que turismo, viajar pode ser um exercício espiritual, uma verdadeira peregrinação: sentir cada paisagem e cada parte dos trajetos como uma extensão de nós mesmos". Estão nas diferenças sociais e culturais os motivos principais de se conscientizar enquanto pessoa do mundo, respeitando-as e vivenciando-as como um aprendizado por meio de ruas, monumentos, museus, praças e fontes. Pode-se até ser solidário e perceber que lugares tão distintos aos nossos costumes e olhos tiveram as mãos de antigos descendentes que prezavam a beleza que hoje desfrutamos - contemplar a natureza e as obras primas de artistas consagrados vai além do arquitetônico, pois toca a alma e nos completa. Como deve ser uma prática espiritual.
Viajar é uma forma de meditação. Mesmo quando o motivo e o lugar para onde se vai não é querido, ela nos oferece lições valiosas e tão íntimas como a própria reflexão sobre as experiências que cultivamos diariamente: saber que o mundo é grande o bastante para aprendermos suas lições, seus segredos e suas distinções. São necessários os riscos, assim como é necessária a evolução interna que uma jornada nos proporciona, por mais curta que seja. Viajar é um ato de amor ao corpo, mente e espírito, pois é sinônimo de liberdade - de nós para com o mundo e vice-versa.
Leonardo Chioda
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