sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Eterna vítima

Incompreendido, fracassado e mal-amado. É assim que se define o portador da “síndrome de vítima”, esse ser que faz da própria biografia uma novela mexicana e vive em busca de culpados que assinem os capítulos.

Todo mundo conhece alguém que se acha a pior das criaturas e acredita que o fracasso, a falta de sorte e a incompreensão alheia estão traçados em seu destino. Pode até ser que seu mapa astral realmente indique algum sórdido cruzamento de planetas, mas muito provavelmente tudo não passa da “síndrome de vítima”, uma moléstia causadora de perturbações como as descritas acima. Qualquer um pode identificar os seres acometidos por este mal, basta observar sintomas como ter sempre na ponta da língua frases do tipo: “Eu não abro mais a minha boca”, “Você tem sempre razão e eu é que estou errada” e por aí vai… Frases quase sempre acompanhadas de expressões não necessariamente verbais. A mais conhecida é a cara fechada, que pode surgir depois que as frases não surtem o efeito desejado ou até mesmo quando surtem, afinal, para a “pseudo-vítima”, manter a pose é fundamental.

Além de serem eternos protagonistas de verdadeiros dramalhões mexicanos, as pessoas possuídas por esta síndrome fazem de namorados, cônjuges, sócios e amigos coadjuvantes dessa saga. E em cena vale tudo: desde chantagens para por fim à discussão até ameaças de quem está prestes a sucumbir a tamanha ingratidão. Tudo não passa de golpe baixo. “É uma maneira de ganhar a discussão quando não se tem razão”, revolta-se. “Detesto quando fazem isso comigo. É muito mais adulto a pessoa admitir que está errada”, desabafa. Aliás, ‘estar errada’ é uma combinação de palavras que não consta no vocabulário dessas incompreendidas criaturas. Segundo a psicóloga Maria Tereza Maldonado, o mais comum é que a ‘vítima’ coloque sempre em sua conta somente as parcelas boas da relação. “Normalmente, o fracasso é culpa do outro e não daquele que acredita ter feito de um tudo para dar certo, se entregando, renunciando, perdoando”, comenta ela, sem citar tudo aquilo que o repertório de mártir contém.

Não é à toa que o passatempo predileto da “vítima” seja brincar de “Detetive”, aquele jogo que tem como principal objetivo encontrar um culpado. Que, no caso dela, são sempre os outros. “Ela se sente prejudicada pelas atitudes da outra parte e não há nada que ela possa fazer para evitar a situação, os outros sim. Está sempre se colocando numa situação de sofrimento e impotência”, ressaltando ainda que a ‘vítima’ realmente sofre muito, mas prefere arcar com este sentimento pela compensação dos ganhos. “Ela provoca o sentimento de culpa na pessoa a quem se dirige e essa estratégia quase sempre é bem-sucedida”, acrescenta. Mas quando o melodrama não cola, o chilique é a saída mais estratégica. “A ‘vítima’ acaba sempre tendo a pessoa sob seu domínio. Quando acontece de sua manipulação não funcionar ou ela se sentir confrontada, fica muito irritada”, assegura a psicóloga, completando que a insegurança, o egocentrismo e a falta de consideração com os desejos dos outros são outras características dos portadores da tal síndrome.

A empresária Ana Luiza Mota conta que viveu uma história digna de um folhetim com sua ex-sócia. “Ela tinha mania de perseguição. Nunca admitia estar errada e, quando eu não concordava com suas idéias, ela simplesmente dava ataques histéricos”, conta. Ana lembra ainda das chantagens emocionais que tinha que escutar, verdadeiras ladainhas. “Sua cabeça doentia devia pensar que ela era a mocinha e eu a vilã. Ela era ridícula! Nossa sociedade ficou impraticável, eu era sua sócia, não sua mãe para administrar seu ego”, conclui.

Para alguns, o primeiro contato com o universo dramático da vítima é quase umbilical, quando logo no início da vida se deparam com mães que defendem a idéia de padecer no paraíso com unhas e dentes. A chantagem emocional protagonizada por elas talvez seja a cena mais comum nos lares das melhores famílias. As falas, o elenco, sempre é tudo igual, só muda o endereço. A dona-de-casa e mãe de três filhos Lígia Lemos acredita que as mães usem o recurso para manter um certo domínio sobre os filhos já crescidos. “Chega um momento em que você não pode mais mandar, então o jeito muitas vezes é apelar para ver se comove”, afirma ela. Na opinião da terapeuta familiar Vera Risi, muitas mães usam esse artifício até mesmo sem perceber. “A mãe tem medo de dizer não para os filhos, acredita que eles vão deixar de amá-la ou que podem não suportar a recusa dela diante do pedido”,a mãe tem que saber dizer ‘não’ e ensinar seu filho a escutá-lo. “Quando ela usa a chantagem para tentar dizer o que deve, está se igualando a ele, sendo infantil, e deixando de usar sua autoridade de mãe e responsável pela criança. Argumentar e mostrar as razões é o que deve ser feito por um adulto”, garante.

Os caminhos para a vítima sair desse mundo de trevas está dentro dela mesma e as pessoas que a cercam podem colaborar com um pouco de luz. Mas se ela realmente não abrir mão dos números de comoção, piedade e remorso que fazem parte de seu show, só restará aos atingidos pelos seus crimes emocionais julgar: vítima ou culpada?

Obs.:
Pessoa que se faz de coitada não se comove.


Fonte: http://www.bolsademulher.com
Imagens: google.com


Nenhum comentário:

Postar um comentário